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Matheus Esteves do Couto

COMENTÁRIOS SOBRE A TEOLOGIA CRISTÃ MEDIEVAL E SEU IMPACTO NO BRASIL LUSITANO

Atualizado: 9 de dez. de 2021




O Direito Medieval


Ao estudar o Direito Medieval, vemos um processo de união entre o direito canônico eclesiástico ocidental e o direito romano que gradualmente sofreu modificações e alterações ao longo da Idade Média e Moderna, tendo início no século XIII e adiante.


Para citarmos um exemplo sobre como teria ocorrido tal integração, podemos falar sobre como os mercadores do século XIII se inseriam na economia medieval. Na teoria tomista (Tomás de Aquino 1225-1275) e na própria doutrina católica, o ofício do mercador seria considerado uma prática pecaminosa e pouco validada pela instituição.


Levemos em consideração que a Igreja Católica ocidental se desenvolveu no meio rural, valorizando apenas o trabalho como forma de consagração e valorização do ato de sustento próprio. O mercador/banqueiro e o comércio seria um ofício inválido, pois a única religião e dedicação do mercador seria a sua moeda. Este, naturalmente era um acumulador de capital, e muitas vezes ganhava suas finanças através da lábia e das palavras, e não com o seu ardor físico, sendo assim, este era execrado pela doutrina católica por não ser a representação de nenhuma das virtudes pregadas por Cristo.


Os ofícios que muito estavam envolvidos com capitais financeiros não são práticas da virtude cristã, portanto consideradas ilegítimas pela doutrina eclesiástica. Vale ressaltar, tal modo de pensamento nos primeiros séculos da idade média era viável, pois estamos falando de um momento em que a atividade comercial era pouco praticada (Século V-XI) e possível por uma série de fatores, camponeses nos feudos por muito tempo poderiam ser autossustentáveis com produtos produzidos nas propriedades senhoriais. Só haverá um renascimento comercial na Europa a partir do século XI, que se intensificará em diante. A Prática.


Esta era a teoria, mas na prática a própria igreja precisava de finanças para seus projetos se concretizarem. Sendo assim, doutores da igreja; teóricos, intelectuais e juristas responsáveis por serem as mentes produtoras de debates na instituição; já muito cedo percebendo isso, começariam a propor modificações na lei eclesiástica no próprio campo do debate sobre o assunto, fazendo uma junção com as teorias do “bem público” de Cícero.


Assim, uma junção surge, o direito romano e o direito eclesiástico legitimam a atividade do mercador como um benfeitor público, não para si só, mas também para seus consumidores e compradores. Naturalmente mercadores já eram incentivados por nobres e membros do clero a exercerem suas atividades, e para estes uma série de incentivos fiscais eram fornecidos muito antes da integração do direito romano e eclesiástico.


O Direito nas Capitanias Hereditárias


As capitanias hereditárias foram um sistema não régio, mas privado, tinha a função de povoar a costa brasileira em uma série de demarcações e províncias, os donatários tinham isenções financeiras até conseguirem se assentar com vilarejos, pequenas cidades e entrepostos comerciais com os indígenas. Além disso, deveriam combater as incursões normandas e bretãs no território com intuito de garantir a presença lusitana nas capitanias.


O direito medieval é explícito na organização deste sistema, o rei concede aos donatários (vassalos de menor calibre) terras com o propósito de povoamento, dá o foro para a edificação de bases, cidades, vilarejos, o combate a nações indígenas hostis, corsários e vassalos do rei da França, assim como mercadores não lusos.


A lógica de incentivos fiscais e povoamento a partir de uma empresa privada foram os primeiros moldes de um capitalismo empreendedor que começava a surgir. Mas Portugal ainda não era um estado centralizado, e em sua totalidade delegava muitas funções a membros da ascendente burguesia além de em seu sistema judiciário estar muito presente a lógica do direito cesarianoteológico. Aos donatários, o rei impunha um sistema simples de fiscalização e de extração de tributos “in natura”.


Os donatários poderiam além de tudo fazer guerra as nações indígenas não aliadas aos portugueses, mediante o instituto da “guerra justa”, ou seja a junção do direito medieval da guerra ao infiel (cruzadas) com o direito romano e sua jurisdição da guerra aos bárbaros( bárbaros que sobre a ótica católica medieval se tornam os infiéis). Até mesmo a captura de escravos indígenas derivava desta jurisprudência e de outras séries de institutos jurídicos que visavam a legalidade dos títulos de escravidão.


Na instauração do Governo Geral em 1549, o poderio régio demorou décadas até que se houvesse a possibilidade de tutelar as capitanias novamente a mão régia, séculos de negociação, alianças e disputas de poder com os donatários, o que não deixa de evidenciar uma mostra de como a lógica medieval tardia se reproduzia na colônia.


Os doutores da igreja e a própria instituição no século XVI servirão como bastião jurídico legal para jurisprudências e decisões no tocante a escravidão, guerra aos ameríndios e senhorios africanos, carregando até os dias atuais heranças da moral cristã do Brasil Lusitano.

 

Por - Matheus Esteves do Couto. A teoria eclesiástica na prática. Contribuição - Daniele Nunes, estudante de direito da Faculdade Dom Bosco.


Fontes - Jacques Le Goff; Mercadores e Banqueiros da Idade Média. Carlos Alberto de Moura Ribeiro Zeron; Linha de Fé, A Companhia de Jesus e a Escravidão no Processo de Formação da Sociedade Colonial (Brasil, Séculos XVI e XVII).


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